Publicar no feed é ‘coisa de velho’? E não ter foto de perfil? Post de professor viraliza e gera debate sobre comportamento nas redes

Professor fez uma pesquisa, sem valor científico, com alunos da rede pública. Lecionando para adolescentes de 13 a 17 anos, ele começou a perceber que, fora da sala de aula, era constantemente adicionado, no Instagram, por contas sem fotos. Imagem ilustrativa mostra a sombra de duas pessoas meendo no celular e o logo do Instagram ao fundo
Reuters
Victor Hugo é professor de história, sociologia e filosofia da rede pública em Bebedouro (SP). Aos 26 anos, ele usa redes sociais como um típico jovem adulto. Seu perfil tem fotos de viagens, de shows, de momentos com amigos, selfies…
👨‍🏫 Lecionando para adolescentes de 13 a 17 anos, ele começou a perceber que, fora da sala de aula, era constantemente adicionado, no Instagram, por contas sem fotos e, algumas vezes, até sem informações básicas de identificação — muitas tinham letras ou números aleatórios no nome.
☝️ Mas quem estava por trás destes perfis misteriosos não era bem um segredo…
“Eu ficava tentando entender o que era, quem era… Eu buscava e descobria que era um aluno meu. Eles próprios geralmente falavam: ‘ah, você viu que eu te segui?’ Isso foi me impressionando”, disse Victor em entrevista ao g1.
🤔 Essa percepção provocou o professor, que decidiu fazer uma pesquisa, sem valor científico, com os próprios alunos — o resultado viralizou na rede social X. Mas antes de prosseguir, é importante ressaltar:
Os alunos de Victor que têm de 13 a 17 anos pertencem à geração Z;
O próprio Victor é geração Z, ainda que quase beirando a anterior, a chamada geração Y (ou millennials);
A idade mínima para ter uma conta no Instagram no Brasil é de 13 anos.
“A geração Z é considerada nativa digital. É a primeira geração que nasceu que não sabe o que é a vida antes da internet. E isso, por si só, já influencia a maioria das características dessa geração”, explicou Thaís Giuliani, doutora em ciências da informação e especialista em geração Z.
As perguntas feitas por Victor aos seus alunos foram:
Por que não postam fotos no feed do Instagram?
Por que dificilmente colocam foto no perfil?
Por que postam só nos stories?
O que acham de quem posta conteúdo frequentemente?
Se acham bonitos/seguros para compartilharem fotos nas redes sociais?
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📣 Aqui vale um alerta: não existe uma resposta exata para a pergunta do título deste texto. É mais uma provocação, um convite à reflexão, do que um guia com um resultado detalhado.
As respostas foram diversas. Veja só algumas delas:
têm os que acham “cringe” ter foto no perfil;
têm os que dizem que “está na moda ser ‘low profile’ (postar pouco);
têm os que acham que quem posta frequentemente “é desocupado e brega”;
têm também aqueles que admitem insegurança com a aparência mesmo (não encontrar uma foto “boa” e ter medo de não ter muitas curtidas foram argumentos que apareceram entre as respostas).
Ao g1, Victor disse que se surpreendeu com o resultado.
“Primeiro, eu acho que eu banalizei, talvez eu tenha achado que eles só não querem lidar com as redes sociais ou que, de alguma maneira, eles são contra. Talvez eu tenha achado que não tinha um problema por trás.”
Não bem um problema, mas, sim, tinha algo por trás. A conclusão, a partir dos dados preenchidos pelos alunos, foi postada no X: era, em grande parte, uma questão de autoestima. “As respostas reforçam questões atuais bem problemáticas sobre a autoestima e também sobre a própria padronização do corpo nas redes. Os mais novos sofrem mais com a autoestima e sentem mais medo em relação às redes. Todos se cobram”, escreveu Victor.
Para Giuliani, independente da geração que for, a questão da autoestima adolescente é um fator relevante nessa discussão.
“Existe a questão da geração, que é o recorte do período que nasceu, porque são momentos históricos, políticos, sociais e econômicos completamente diferentes. E outra coisa é a adolescência. Que é uma fase normal de muito complexo em relação à autoestima, que eu acho que é uma das principais causas relacionadas a essa questão de foto, de imagem [das redes sociais]”, afirmou Giuliani ao g1.
De modo geral, mais que uma característica das gerações Z, X ou qualquer outra, para todos a adolescência é (ou foi) uma fase…
de ebulição hormonal;
de nascimento de pelos;
de nascimento de espinhas;
de mudanças na textura da pele;
de mudanças no cabelo;
e, principalmente, de mudanças no corpo como um todo (mais altos, mais largos, crescimento das mamas, mudança na voz…).
A vida no Instagram (e antes dele)
🔙 Para contexto: o Instagram surgiu em 2010, em uma época em que estava disponível apenas para usuários iOS (iPhone) e levou uns anos até ser liberado para Android. Naquele momento, era uma rede só de fotos de celular de baixa qualidade, com filtros que mudavam as cores e a saturação, por exemplo — mas nada de recursos que afinam o nariz e aumentam os lábios, como vemos hoje. Também não tinha, ainda, a ferramenta stories, que veio em 2016, em que fotos e vídeos desaparecem após 24 horas.
Publicar fotos nas redes sociais não é uma característica exclusiva do Instagram e da geração de agora. Antes, havia o finado Orkut, que durante muito tempo permitia apenas 12 fotos (mas que eram atualizadas sem receios entre adolescentes e adultos de diferentes gerações que usavam a rede).
Depois, veio o Facebook, que permite ter diversos álbuns e muitas e muitas fotos (e que, hoje, em 2024, é quase nada usado pela geração Z, mas que por muito tempo foi a queridinha dos millenials depois do Orkut).
Ainda assim… Por que os jovens de hoje, a geração Z, parecem evitar mais a exposição no Instagram?
Como explica Giuliani, é uma geração que se preocupa com questões de saúde mental — para além de ser afetada diretamente por isso, muito por causa dos anos escolares durante a pandemia, quase que totalmente na frente de telas e câmeras abertas em aulas.
Por isso, talvez, pode soar que eles se sintam mais inseguros com a aparência física típica da adolescência que antigamente (o que não existe uma comprovação clara ainda). E, além disso, é uma geração mais protegida.
“É uma geração que tem uma uma fragilidade maior por diversos aspectos, não só pelas redes sociais, não só pela tecnologia, mas também muito pela forma como foram criados, num modelo em lidar com pouca frustração ao longo da infância e da adolescência, o que acabou, de certa forma, impactando negativamente nessa questão mais da formação da resiliência”, diz Giuliani.
E é importante também lembrar que as redes de antigamente não tinham os influenciadores de hoje com milhões de seguidores, vidas irreais e filtros que mudam o rosto para formatos milimetricamente perfeitos.
Foto ilustrativa mostra Cara Delevingne e Sam Smith depois do Rock in Rio 2015; ne época, os filtros eram apenas de cor, luz e saturação.
Reprodução/Instagram/Samsmith
Quanto aos adolescentes da geração Z, eles até ocupam o Instagram, sim, mas sem aparecer tanto (como o observado na pesquisa do Victor, ainda que algumas vezes sem foto). Algo reforçado por Giuliani: eles não se exibem, mas falam, engajam.
Ainda assim… Eles preferem mesmo o TikTok — e isso é geracional e típico do fluxo das redes, como aconteceu com o Orkut e o Facebook (uma vai substituindo outra na preferência). Olha só: uma pesquisa da Adobe de abril deste ano apontou que 64% dos jovens nascidos entre 1995 e 2010 já trocaram o Google pelo TikTok para fazer buscas.
E os millenials?
E quanto ao hábito de jovens (mais adultos) de postarem mais fotos de viagens e de comida? Bem… Talvez isso seja uma herança dos primórdios do Instagram (quando os adolescentes da vez, hoje adultos, estavam descobrindo as ferramentas que a rede dispunha).
No começo da rede era comum (e cool) publicar fotos de fim de semana na balada, com amigos, em restaurantes diferentes e durante viagens. Vale lembrar: dividir esses momentos no online era bem mais difícil mesmo uns anos atrás, no começo do Instagram, com conexões menos acessíveis e quando tudo era mato na internet.
“O millenial tem um comportamento um pouco diferente nas redes sociais do que da geração Z. Se a geração Z tem esse receio de exposição, toda aquela questão do aspecto da autoestima, ele gosta de ver, de olhar, mas muitas vezes não de se expor”, avaliou Giuliani.
“Eles são mais abertos pra isso, têm uma postura mais de compartilhar essas experiências, porque os valorizam muito a experiência. É a primeira geração que começa quando a gente fala de compra, de venda, de serviço do millenial como cliente, como consumidor. É a primeira geração que acaba valorizando muito essa questão da experiência da marca”, finalizou Giuliani.

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